Fundada por René Saleme, a Piedade jamais lançou marca própria, diferentemente da maioria que abriu as portas para as ciganas. Isso até 27 de março, quando a cervejaria se instalou na Rua da Carioca, que está sendo transformada no principal polo da cerveja artesanal do Rio de Janeiro. “No novo endereço, reinventei o negócio”, diz Saleme. No que dependesse dele, a Piedade continuaria produzindo cervejas somente para terceiros. “O problema é que as marcas ciganas, em geral, desapareceram”, resigna-se o empresário.

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Na Rua da Carioca, no centro da cidade, a Piedade vende 11 cervejas próprias entre os estilos pilsen, witbier e hop lager. Registre-se que, desde 2017, a cervejaria elaborou mais de uma centena de receitas para cerca de 50 ciganas, como Bad Dog, Bella Craft Beer e Jamile. Em homenagem à trajetória da Piedade e à sua carteira de clientes do segmento B2B, Saleme pretende produzir uma dessas receitas a cada mês.

Em julho, a fábrica em Piedade será desativada e a produção vai migrar, integralmente, para o centro do Rio. A capacidade de produção da nova sede é de 40 mil litros por mês e a expectativa de Saleme é vender um quarto disso no próprio endereço, para o público final — a cervejaria continua a aceitar encomendas de outras marcas.

Na nova localização, Saleme dispõe de 750 metros quadrados espalhados por três andares. Trata-se de um brewpub — ou seja, além de produzir cerveja e vender para quem cruzar a porta, o estabelecimento dispõe de cozinha. “A Rua da Carioca ainda está muito esvaziada, mas estamos confiantes”, diz o fundador. “Na hora do almoço, ainda estamos atendendo de 30 a 40 pessoas, sendo que temos 150 lugares”. No térreo, a Piedade divide espaço com um ponto de venda da Martelo Pagão, uma marca de hidromel produzido pela cervejaria. O rooftop deverá abrir até o final do ano.

A conversão da Rua da Carioca em um polo da cerveja artesanal partiu da prefeitura. Trata-se de uma iniciativa prevista no projeto Reviver Centro, viabilizado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico (SMDE) em parceria com a Companhia Carioca de Parcerias e Investimentos (Car). As cervejarias interessadas em se instalar na via têm direito aos seguintes subsídios municipais: R$ 1 mil por metro quadrados para reformas e R$ 75 por metro quadrado mensais para despesas, com um teto para imóveis de até 200 metros quadrados. Os rees mensais terão duração de 30 a 48 meses.

Pelas contas da prefeitura, a “Rua da Cerveja”, como a Carioca vem sendo chamada, poderá movimentar R$ 222 milhões em quatro anos, gerando uma massa salarial de R$ 41,8 milhões com 500 novos empregos. “O papel do poder público é incentivar, estimular”, Osmar Lima, o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, declarou em março. “É o que estamos fazendo com a Rua da Carioca, ajudando a recuperar uma rua icônica, que tinha metade das lojas fechadas. Aos poucos, a rua volta a ganhar vida”.

“Os estímulos da prefeitura são bem-vindos, mas o que fará com que essas cervejarias se mantenham de pé é o fluxo de visitantes”, alerta Fernando Blower, presidente do sindicato de bares e restaurantes do Rio de Janeiro (SindRio). “Elas precisam se unir para criar estratégias em conjunto que aumentem o interesse pela Rua da Carioca, que estava às moscas até há pouco”. A união, nesse caso, faz toda a diferença. “Se só uma cervejaria fosse para lá, ela provavelmente duraria pouco tempo”, Blower acredita. “Sendo várias, a via tem tudo para se transformar em um novo polo turístico e contribuir com a revitalização do centro”.

A Piedade foi a segunda cervejaria a se instalar na “Rua da Cerveja”. A primeira foi a Vírus Bier, que chegou em setembro do ano ado. “Enxergo a ‘Rua da Cerveja’ como um projeto mágico”, diz Luiz Oliveira, fundador da marca pioneira. “Além de criar um novo pólo turístico no Rio de Janeiro, ajuda a dar mais visibilidade e força para o nosso segmento. Os turistas estrangeiros que desembarcam na cidade não querem tomar as cervejas mainstream — querem provar as artesanais cariocas. Agora, há uma rua só para isso”.

A Vírus Bier foi fundada em 2017 como uma marca cigana. Inicialmente, a produção estava a cargo — você adivinhou — da Piedade. Em 2020, montou sua própria fábrica na região da Praça da Bandeira, onde não vendia para o consumidor final — até o ano ado, a marca se restringia ao delivery. Transferida para a Rua da Carioca, a fábrica se converteu em brewpub. São 180 metros quadrados e a capacidade de produção é de 3 mil litros por mês. Das 9 cervejas da marca, a pilsen Antivírus e a IPA Filomena são as campeãs de pedido — a segunda homenageia a tartaruga de Oliveira. “Não vejo a hora de ver mais cervejarias funcionando por perto”, diz ele. “A concorrência, nesse caso, é muito positiva pois ajuda a atrair mais gente para a rua toda”.

Nas próximas semanas, se tudo der certo, entra em cena a terceira cervejaria da Rua da Carioca, a Cotovelo. Trata-se de uma parceria entre as cervejarias Búzios e Tio Ruy e o empresário Raphael Vidal, que ajudou a transformar o Largo da Prainha em um dos principais polos turísticos do centro da cidade — ele é dono do botequim Bafo da Prainha e do restaurante Dois de Fevereiro, entre outros empreendimentos. Por que cotovelo? “É para quem gosta de beber com o cotovelo encostado no balcão”, explica Vidal.

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Rua da Carioca, novo polo da cerveja artesanal no Rio, ganha 3º inquilino | CNN Brasil V&G